A prisão preventiva é uma das medidas mais delicadas do processo penal. Prevista no artigo 312 do Código de Processo Penal, ela deveria ter caráter excepcional, aplicada apenas quando estritamente necessária para garantir a ordem pública, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal. No entanto, na prática forense brasileira, observa-se que a excepcionalidade da prisão preventiva muitas vezes se transforma em regra disfarçada, o que compromete gravemente os princípios constitucionais da presunção de inocência e da liberdade.
A lógica da prisão preventiva deve ser cautelar, não punitiva. Trata-se de uma medida instrumental, voltada à proteção do processo, e não de antecipação de pena. Quando o juiz decreta a prisão preventiva com base em fundamentos genéricos, como “garantia da ordem pública” sem elementos concretos, ele acaba ampliando o poder punitivo estatal de forma indevida. A consequência é a violação direta ao princípio da proporcionalidade e à presunção de inocência, previstos no artigo 5º da Constituição Federal.
A jurisprudência dos tribunais superiores vem, gradativamente, reforçando essa compreensão. O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça têm decidido que a prisão preventiva exige fundamentação individualizada e baseada em fatos concretos. Não basta mencionar a gravidade abstrata do delito ou o clamor social. O juiz deve demonstrar, de forma objetiva, como a liberdade do acusado pode comprometer o processo ou a sociedade.
Além disso, o Pacote Anticrime (Lei nº 13.964/2019) reforçou o controle sobre as medidas cautelares pessoais, exigindo revisão periódica das prisões preventivas a cada 90 dias (art. 316, § único, CPP). Essa inovação foi uma tentativa de evitar a perpetuação de prisões provisórias que, na prática, se transformam em verdadeiras antecipações de pena.
Para o advogado criminalista, o tema exige vigilância constante. A defesa deve atuar de forma técnica, demonstrando a ausência dos requisitos da prisão preventiva e propondo medidas cautelares alternativas, como o comparecimento periódico em juízo ou a proibição de contato com testemunhas (art. 319, CPP). Em um Estado Democrático de Direito, a liberdade é a regra — a prisão, a exceção.
Em suma, discutir os limites da prisão preventiva é discutir os limites do próprio poder punitivo. A função do Direito Penal e Processual Penal não é apenas punir, mas garantir que a punição, quando necessária, seja imposta de forma justa, proporcional e dentro da legalidade. Preservar a liberdade enquanto valor central é preservar a essência da democracia.
